
Carta aberta – Posicionamento contrário a dispositivos do PL 12
A Interfarma e mais 7 entidades assinaram carta aberta com posicionamento contrário ao Projeto de Lei 12/2021. A carta foi entregue ao Ministério da Economia na sexta-feira, 27 de agosto.
O PL 12/2021 altera a legislação vigente de patentes (Lei 9.279/96) e modifica os dispositivos relacionados à possibilidade de concessão de licença compulsória de ofício nos casos de emergência nacional ou internacional, ou ainda em casos de interesse público, declarados em ato do Poder Executivo Federal.
A carta é assinada por ABIMED, ABPI, ABAPI, Croplife, Brazil US Business Council, Global Innovation Policy Center (GIPC) e Brasil International Chamber of Commerce (ICC), além da Interfarma.
CARTA ABERTA – POSICIONAMENTO CONTRÁRIO A DISPOSITIVOS DO PL 12
Pelas razões abaixo expostas, as Entidades signatárias vêm por meio desta Carta apresentar-se contrárias a sanção presidencial do PL 12/2021, sob a forma do texto substitutivo aprovado pelo Senado Federal em 11.08.2021.
- O PL 12 altera a legislação vigente de patentes (Lei 9.279/96) e modifica os dispositivos relacionados à possibilidade de concessão de licença compulsória de ofício nos casos de emergência nacional ou internacional, ou ainda em casos de interesse público, declarados em ato do Poder Executivo Federal.
- Portanto, a concessão de licenças compulsórias em situações excepcionais já é permitida pela legislação vigente e encontra, na forma como adotada pelo País, respaldo constitucional perante tratados internacionais aos quais o Brasil é signatário. Não é necessário alterar a lei para que haja a “quebra” de patentes, se assim julgar pertinente o Estado brasileiro.
- Além da Lei de Patentes, é igualmente possível que haja licenciamento compulsório de patente que comprovadamente seja utilizada como instrumento de abuso econômico, nos termos do art. 36 e 38 da Lei 12.529/11 (Lei de Defesa da Concorrência).
- Passados quase 18 meses da pandemia, não há no País qualquer processo investigativo para avaliar desabastecimento por culpa de titulares de patentes ou uso abusivo destas que poderiam ensejar qualquer licença compulsória.
- Indiscutível que compete ao Congresso Nacional propor alterações aos marcos legais postos. Contudo, a discussão sobre a flexibilização de direitos de propriedade intelectual (incluídas patentes) envolve harmonização aos ditames constitucionais e cumprimento pelo país dos Tratados Internacionais adotados, o que não parece ocorrer com o texto recém aprovado.
- Sem um sistema de propriedade intelectual equilibrado e juridicamente seguro não há ambiente favorável aos investimentos em inovação e desenvolvimento de novas soluções tecnológicas, em qualquer setor econômico. A alteração legislativa é contraproducente em implementar no país regras jurídicas adequadas a fomentar a ação dos setores inventivos instalados no país e embasar maior investimento de recursos, capital humano e tempo no desenvolvimento de produtos que a população necessita hoje e necessitará no futuro.
- Primeiro: enfatizamos que, a despeito de largo debate, não há consenso internacional quanto a necessidade de “quebra de patentes” para combater a pandemia de Covid-19 ou sequer flexibilização da proteção das invenções desenvolvidas para combate à pandemia. A discussão segue pendente na Organização Mundial do Comércio, entidade responsável pela administração do Tratado TRIPS há quase 1 ano. Em contraposição ao que tem sido divulgado por parlamentares, os entraves ao combate à pandemia (e ao acesso das vacinas em especial) são de natureza política, econômica e logística, com a dificuldade operacional de produção, estoque e distribuição global de insumos e produtos finalizados.
- Segundo: o PL 12 não se limita ao contexto da pandemia de Covid-19, como originariamente proposto pelo Senado Federal. É uma alteração à lei vigente com impactos potenciais a quaisquer setores inovadores que se beneficiem da proteção à propriedade intelectual. A avaliação do texto não contou com tal perspectiva, pois tramitou em regime de urgência sem o devido debate público democrático, participação efetiva dos interessados e a apreciação do tema em Comissões temáticas e Câmaras especializadas. O rito sumário pelo qual o PL 12 foi avaliado no Senado e na Câmara impediu análise mais técnica do Parlamento.
- Terceiro: não se tem qualquer notícia de que houve concessão de licença compulsória para combate da atual pandemia em nenhum país do mundo. A despeito disso, a vacinação avança em todos os continentes, inclusive no Brasil com cooperação de laboratórios e entidades públicas brasileiras ou fornecimento direto (notadamente Fiocruz, AstraZeneca, Sinovac, Butantan, Pfizer e Janssen), além de acordos supranacionais como o Consórcio Covax e doações de quantitativos extras de países já abastecidos.
- Ressaltamos que há unanimidade dentre as signatárias, aqui representantes de importantes setores econômicos e entidades civis brasileiras, de que o texto ora aprovado do PL 12 propõe mecanismo de concessão de licenças compulsórias que não foi adotado por nenhum outro país.
- Para além da inventividade legislativa, entende-se serem questionáveis algumas das disposições contidas no texto frente aos termos da Constituição Federal e do Tratado TRIPS. Vale pontuar que a proteção aos direitos de propriedade industrial possui hierarquia de direito fundamental pela Constituição Federal (art. 5 XXIX), na visão do Constituinte que sua proteção é condizente com o interesse público e o desenvolvimento econômico nacional.
- Em especial, a obrigatoriedade de transferência de tecnologia pelo titular da patente licenciada compulsoriamente (parágrafos 8 a 11) é frontalmente contrária ao art. 39 do TRIPS (incorporado no sistema legislativo pelo Decreto 1.355/94) que protege os segredos industriais e fere o direito à liberdade econômica garantido pela Constituição Federal.
- A pandemia tem evidenciado ainda mais a importância das indústrias farmacêutica e de dispositivos médicos e do setor da saúde como um todo. A vacinação no Brasil de mais de 100 milhões de cidadãos somente foi possível pelo desenvolvimento de produtos em rapidez e escala sem precedentes e pelo bom relacionamento do país com demais nações e empresas estrangeiras. A proteção à inovação, o cumprimento do regime jurídico adotado, o incentivo econômico e legal ao investimento em pesquisa e desenvolvimento de hoje são cruciais para termos respostas adequadas às crises e futuras emergências que afetarão a população brasileira.
- É necessário promover as condições para desenvolvimento dos setores de pesquisa e desenvolvimento, com segurança jurídica, estímulo à inovação e Leis bem estabelecidas. A alteração de legislação vigente de forma contrária a compromissos internacionais, sem devido debate democrático, sem alinhamento com outros países do mundo e a despeito de qualquer indicativo de necessidade frente ao momento presente gera desconfiança e incerteza dentre os agentes não apenas das indústrias farmacêutica e de dispositivos médicos, mas também de outros setores como da indústria de inovação.
São Paulo, 25 de agosto de 2021.