Ministro da Saúde, Ricardo Barros, é alvo de novas representações

O Globo / Site

Após afirmar que não se “submete” a uma decisão da Justiça Federal durante uma audiência na Câmara dos Deputados, o ministro da saúde Ricardo Barros foi alvo de uma nova representação da Procuradoria da República em Pernambuco. Desta vez, o Ministério Público Federal acusou Barros de cometer os crimes de desobediência, dispensa indevida de licitação e ato atentatório à dignidade da Justiça e encaminhou na última sexta-feira, o caso à Procuradoria-Geral da República para decidir se vai investigá-lo criminalmente.

Já é a segunda representação contra o ministro encaminhada à PGR envolvendo a compra de hemoderivados, medicamentos para pacientes que sofrem de hemofilia, fora da parceria feita com a Hemobras, estatal criada para fornecer estes medicamentos. O MPF já havia encaminhado uma manifestação à PGR em outubro após constatar que o Ministério da Saúde estava preparando um pregão para a compra dos medicamentos mesmo depois de a Justiça Federal determinar que fosse mantida a Parceria de Desenvolvimento Produtivo (PDP) firmada com a Hemobrás para a aquisição dos medicamentos e transferência de tecnologia para a estatal brasileira.

Ao todo, já foram quatro decisões da Justiça Federal em Pernambuco determinando que o Ministério adquira os medicamentos, chamados de Fator VIII, dentro da PDP para garantir o abastecimento em todo o país em 2018. Foi neste cenário que, em audiência pública na última terça-feira, 27 de fevereiro, para prestar contas de suas atividades, o ministro disse que a aquisição dos medicamentos via PDP estaria causando prejuízo.

— Uma decisão judicial para comprar Fator Recombinante da Hemobras e da Shire (empresa que firmou a PDP para a produção dos medicamentos e transferência de tecnologia junto à Hemobras) por R$ 1,11, quando eu tenho a R$ 0,76 da Novonordisk, ou quando eu tenho a R$ 0,75 da Octapharma. E a Justiça acha que quer me obrigar a comprar mais caro e a atender menos pessoas. Eu não me submeto. Eu não submeto. Eu não vim para o Ministério para deixar tudo como estava, eu vim para fazer melhor, afirmou Barros na audiência ao ser indagado pela deputada Mara Gabrili (PSDB-SP) sobre o fornecimento dos hemoderivados no País.

— Eu não tenho medo dos óbitos, eu não tenho medo da pressão, eu não tenho medo desse discurso. Então não venha debitar para mim esses óbitos. Ajudem a resolver o problema na ANVISA e na Justiça Federal para que a gente possa entregar o medicamento que nós já compramos e não conseguimos entregar para o cidadão — seguiu o ministro na audiência.

Para a procuradora da República Silvia Regina Lopes, que acompanha o caso e entrou com uma ação civil para garantir o cumprimento da PDP, a fala do ministro seria uma prova de crime e de que ele não estaria respeitando as decisões judiciais. Além de encaminhar a nova representação à PGR ela também fez um novo pedido à Justiça Federal para que a Hemobras seja autorizada a contratar a produção de 385 mil Unidades Internacionais do Fator VIII para evitar o desabastecimento no País.

— A declaração do Ministro de Estado de que já adquiriu o medicamento Fator VIII Recombinante fora da PDP representa a confissão da prática do cometimento do crime de dispensa indevida de licitação (art. 89 da Lei nº 8.666/93), porquanto, além de não se enquadrar na hipótese de dispensa em favor de parceiro privado, não há nenhum registro,no Diário Oficial da União, da adoção de medidas com vistas a preservar as formalidades pertinentes, aponta a procuradora no pedido à Justiça Federal.

Para ela, Barros age de forma “desleal” e com “deliberada má-fé”.

— Rememore-se que esse risco foi criado por Sua Excelência o Ministro de Estado em razão de inúmeras tentativas de adquirir o Fator VIII Recombinante em desrespeito à legislação vigente e em ocasião da deliberada omissão em cumprir as decisões desse Juízo.

A PDP, firmada em 2012, prevê a produção dos medicamentos em uma fábrica em Goiana, Pernambuco, que deveria ter sido concluída em 2014, mas ainda não está atuando em sua capacidade total.

Em julho, o ministério suspendeu a PDP alegando, entre outros motivos, que não estava ocorrendo a transferência de tecnologia prevista no acordo. A decisão gerou polêmica, pois ao mesmo tempo o ministro vinha anunciando sua intenção de construir uma fábrica de hemoderivados em Maringá, no Paraná, seu reduto eleitoral.

Por meio de nota, a assessoria de imprensa do Ministério informou que a decisão judicial mandando seguir a compra via PDP causaria um prejuízo de R$ 142, 6 milhões.

— Ainda dever ser observado que as etapas de transferência de tecnologia não foram cumpridas e a demanda supera o contrato vigente com a empresa pública, não justificando a insistência sobre o tema, diz a nota que afirma ainda que a pasta vai buscar o ressarcimento dos valores pagos acima do mercado “para o cumprimento da decisão judicial”.

Fontes ligadas à Hemobras, contudo, afirmaram que os preços anunciados pelo ministro não levam em conta fatores como a logística e a transferência de tecnologia. Em outubro do ano passado, o Tribunal de Contas da União também determinou que fosse mantida a PDP com a Hemobras.

Segundo a área técnica do Tribunal, já foram aplicados cerca de R$ 2,1 bilhões, se considerados os contratos que foram assinados para a aquisição dos equipamentos previstos para as próximas etapas. Além disso, segundo o TCU, a criação de uma nova PDP com uma empresa privada implicaria na necessidade de construção de uma nova fábrica e de aquisição de outros equipamentos. 

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