Política Português 19/08/2015

Interfarma defende mais agilidade na avaliação dos protocolos de pesquisas clínicas

Embora o Brasil seja um dos países mais atraentes do mundo para a realização de pesquisas clínicas, ele está desperdiçando inúmeras oportunidades de integrar importantes estudos internacionais. Isso acontece principalmente pela demora excessiva na avaliação dos protocolos de pesquisa, que chegam a levar o dobro da média mundial.
Nos Estados Unidos, um protocolo de pesquisa é aprovado em até 45 dias. Na Europa, a maioria dos países analisa os pedidos em até 75 dias. Dificilmente o retorno ao pesquisador é dado após 80 dias na África do Sul e 110 dias na Índia. Mas o Brasil precisa de pelo menos 365 dias para responder se o protocolo foi ou não aceito, passo fundamental para se iniciar um estudo clínico. Assim, com burocracia e lentidão, o país vai perdendo espaço no cenário mundial de pesquisa e da inovação.
Essa diferença leva muitos pesquisadores a cancelarem seus pedidos de pesquisa clínica no país antes da resposta, fazendo com que os estudos sejam conduzidos apenas no exterior. Quase 30 estudos tiveram o pedido cancelado entre janeiro de 2013 e janeiro de 2015, de um total de 131 submetidos à ANVISA e à CONEP (Comissão Nacional de Ética em Pesquisa), segundo levantamento realizado pela ABRACRO (Associação Brasileira de Organizações Representativas de Pesquisa Clínica).
O grande desafio que o país enfrenta hoje está no sistema CEP/CONEP, responsável pela análise ética dos pedidos de pesquisa clínica. O pesquisador apresenta seu pedido a um dos 650 CEPs (comitês localizados em universidades, hospitais e nos estados), que analisa o projeto. Se o protocolo apresentado estiver de acordo com as regras de proteção ao sujeito da pesquisa, ela é aprovada.
Mesmo tendo sido aprovado no CEP, o protocolo é novamente submetido à CONEP, que faz nova avaliação. O órgão deveria ser normativo e fiscalizador, mas acaba refazendo o processo. Assim, no Brasil, existe uma dupla apreciação que gera demoras insustentáveis a muitos pedidos.
Além da análise ética, existe a análise regulatória. Mas ela passou por uma mudança recente que, se for realmente implantada, irá trazer muitos benefícios ao país. Agora, a ANVISA tem 90 dias para decidir se aprova ou não um estudo. Esse prazo foi festejado amplamente pelas comunidades acadêmica e científica. Mas o problema segue no sistema CEP/CONEP.
Proposta frustrante
Pressionada para apresentar soluções semelhantes, a CONEP lançou em maio uma proposta (minuta de consulta pública para acreditação de CEPs) que basicamente troca uma burocracia por outra; uma mudança que não muda nada. Isso gerou uma enorme frustração na comunidade científica e entre os pesquisadores.
Há dois anos, o então ministro da Saúde, Alexandre Padilha, com apoio da presidente Dilma Rousseff, elaborou uma proposta para mudar a situação. Mas ela foi rejeitada pela CONEP e pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS). Então, vivemos um impasse. O que a CONEP apresenta, ninguém aceita. O que todo mundo quer, a CONEP não aceita.
Neste cenário, a senadora Ana Amélia (PP/RS) apresentou um projeto de lei no Senado Federal que pretende debater, no âmbito do Legislativo, uma solução que possa trazer um novo cenário de pesquisa clínica no Brasil, beneficiando o paciente brasileiro.
Para a Interfarma, o mais importante é que Brasil passe a ter um papel relevante no cenário mundial de pesquisa, com benefícios à inovação e aos pacientes.
Para o presidente-executivo da Interfarma, Antônio Britto, o que está em jogo não é a ética. “Isso ninguém discute. O que sempre questionamos é a lentidão e a burocracia que impedem o Brasil de avançar. Outros países conseguem ter ética e, ao mesmo tempo, ter agilidade suficiente para serem inovadores”, destaca.
“O Brasil tem ilhas de excelência como o Hospital Sírio-Libanês, a Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz) e o INCA (Instituto Nacional do Câncer). Eles não têm ética também?”, questiona Britto.
Posição medíocre
O mercado farmacêutico mundial investe entre 16% e 18% de seu faturamento em pesquisa clínica, o que significa algo entre US$ 160 bilhões e US$ 180 bilhões. O Brasil, embora seja o sétimo mercado mundial do setor, recebe apenas US$ 200 milhões para pesquisa clínica. “Isso nos coloca numa posição medíocre”, avalia o presidente-executivo da Interfarma.
As pesquisas clínicas mais relevantes para a ciência são multicêntricas, ou seja, elas são conduzidas em diversos centros de pesquisa mundo afora. Isso é necessário para testar a eficácia e a segurança de tratamentos experimentais sob condições diferentes e em populações com perfis étnicos distintos.
É por isso que o Brasil é tão atraente aos cientistas. Aqui existe uma população de 200 milhões de pessoas, que vive em diferentes climas e possui perfis étnicos distintos. Para a indústria farmacêutica, não há prejuízos em conduzir a pesquisa em outros países. Quem perde é o Brasil, a sua comunidade científica e sua população.
Com as pesquisas importantes sendo feitas apenas no exterior, o cientista precisa deixar o país para continuar se qualificando e participar dos grandes projetos. O paciente também perde, porque ele precisa deixar o país para ter acesso aos tratamentos experimentais, que são a última esperança no caso de quem não tem resultados com os tratamentos convencionais. Mas nem todos podem ir a outros países e permanecer lá o tempo necessário à pesquisa.
A Interfarma defende mais agilidade na aprovação de pesquisas clínicas para que o Brasil, além de atraente, seja também um país viável para a realização dos mais importantes estudos multicêntricos do mundo. Já contamos com ilhas de excelência e pesquisadores altamente qualificados. Precisamos agora explorar o nosso potencial.
PONTOS DEFENDIDOS PELA INTERFARMA SOBRE PESQUISA CLÍNICA:
• O processo de avaliação de protocolos clínicos no Brasil precisa estar dentro da média mundial (seis meses). Hoje, o país requer o dobro dessa média;
• A dupla análise realizada pelo sistema CEP/CONEP, em que estudos analisados pelo CEP precisam ser analisados novamente pelo CONEP, é um dos principais entraves da pesquisa clínica no país atualmente;
• A análise ética dos protocolos de pesquisa clínica é fundamental e precisa ser mantida. Mas entendemos que existam ambientes perfeitamente qualificados para tal tarefa, além da própria CONEP;
• É necessário que a ANVISA cumpra a nova legislação referente ao tempo máximo de 90 dias para análise e liberação de estudos clínicos.

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