Setor Português 15/01/2014

Brasil pode voltar à OMC contra o algodão dos EUA

Imagem: Epitácio Pessoa|Estadão

Cláudia Trevisan | O Estado de S.Paulo

WASHINGTON – Os produtores brasileiros de algodão ameaçam iniciar um novo painel na Organização Mundial do Comércio (OMC) contra os Estados Unidos caso a lei agrícola em discussão no Congresso americano preveja subsídios que continuem a distorcer os preços globais da commodity e estimulem artificialmente a ampliação da área plantada no país. Segundo eles, os textos em análise podem criar uma situação mais prejudicial que a atual caso os preços caiam abaixo de US$ 0,60 a libra – atualmente a cotação está em US$ 0,80.

Além disso, os produtores manifestaram apoio à decisão brasileira de retaliar os EUA em razão do descumprimento da decisão da OMC de 2009 que considerou os subsídios americanos incompatíveis com as regras multilaterais de comércio.
A Câmara de Comércio Exterior (Camex) decidiu em dezembro que as penalidades, no valor de US$ 830 milhões anuais, podem começar a ser aplicadas no dia 28 de fevereiro. Desse valor, US$ 465 milhões serão impostos por meio do aumento de tarifas de importação. O restante terá a forma de quebra de direitos de propriedade intelectual, na primeira vez em que esse tipo de medida será aplicada em todo o mundo, segundo Welber Barral, ex-secretário de Comércio Exterior e consultor da Associação Brasileira de Produtores de Algodão (Abrapa).

A retaliação foi evitada em 2010 por um acordo pelo qual os Estados Unidos pagariam compensação de US$ 147 milhões anuais aos produtores brasileiros enquanto o Congresso discutisse a aprovação de uma nova lei agrícola, que supostamente acabaria com os subsídios distorcivos.

Apesar de a legislação ainda não ter sido votada, os EUA suspenderam os pagamentos de maneira unilateral em setembro, abrindo caminho para o Brasil retaliar. Agora, existe o risco de as distorções continuarem, mesmo com a mudança da legislação, ressaltaram os representantes do produtores. A principal fonte de preocupação é um sistema de seguro conhecido pela sigla Stax, pelo qual o governo paga 80% do prêmio da apólice, que cobre de 10% a 30% de perdas de receita em relação à receita esperada.

Mark Langevin, da consultoria BrasilWorks, afirmou que o sistema estimula a ampliação da área plantada para além do que o mercado pode absorver e por razões não relacionadas à oferta e demanda da commodity. “Os produtores americanos estariam isolados das forças de mercado.”

O presidente da Abrapa, Gilson Ferrúcio Pinesso, ressaltou que a aplicação de retaliações não é uma boa saída nem para o Brasil nem para os EUA, mas pode ser a única no cenário atual. “O que nós não entendemos é como a maior potência mundial, criadora da OMC, não pode cumprir as determinações da OMC depois de um contencioso que durou 10 anos”, disse.

A posição dos produtores brasileiros foi apoiada por Charles Dittrich, vice-presidente do National Foreign Trade Council. Segundo ele, a entidade defende um comércio internacional baseado no respeito às regras existentes e às decisões da OMC.

O conselheiro consultivo da Abrap, Haroldo Rodrigues da Cunha, ressaltou que o Brasil não estará sozinho em um eventual pedido de novo painel da OMC contra os EUA. A Austrália e produtores da África serão convidados a participar da iniciativa.

Barral ressaltou que é impossível chegar a um número sobre o potencial dano sem o texto final da lei agrícola. Mas disse que projeções realizadas com os modelos econométricos usados pela OMC apontam para um impacto anual de US$ 100 milhões a US$ 600 milhões apenas para os produtores brasileiros.

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